RESUMO: O interesse recursal do réu em face de sentença terminativa diante do princípio da primazia da decisão de mérito consagrado pelo Código de Processo Civil de 2015.
PALAVRAS-CHAVE: Interesse recursal. Réu. Sentença terminativa. Princípio da primazia da decisão de mérito. Código de Processo Civil de 2015.
SUMMARY: The defendant’s interest in appealing against a definitive civil sentence through the view of the ‘Principle of the primacy of decisions’, as established by the Brazilian Code of Civil Procedure of 2015.
KEY-WORDS: Interest to appeal. Defendant. Definitive Civil Sentence. Principle of the primacy of decisions. Brazilian Code of Civil Procedure of 2015.
À luz do Código de Processo Civil de 1973 havia, tanto na doutrina quanto na jurisprudência, uma controvérsia a respeito do interesse recursal do réu em caso de extinção do processo sem resolução do mérito.
Vale dizer, uma vez declarado extinto o processo sem resolução do mérito, discutia-se se teria o réu interesse em interpor recurso de apelação pretendendo a improcedência do pedido, com declaração, pois, de extinção do processo com resolução do mérito.
Da exegese dos ensinamentos do Prof. José Carlos Barbosa Moreira[1] concluía-se haver interesse recursal na hipótese, senão vejamos:
[…] Interesse em recorrer – Configura-se esse requisito sempre que o recorrente possa esperar, em tese, do julgamento do recurso, situação mais vantajosa, do ponto de vista prático, do que aquela em que o haja posto a decisão impugnada (utilidade do recurso) e, mais, que lhe seja preciso usar as vias recursais para alcançar esse objetivo (necessidade do recurso). Em relação à parte, alude o art. 499 à circunstância de ter ela ficado ‘vencida’ (sucumbência, conforme se costuma dizer em doutrina); o adjetivo deve ser entendido como abrangente de quaisquer hipóteses em que a decisão não tenha proporcionado à parte, ao ângulo prático, tudo que lhe era lícito esperar, pressuposta a existência do feito.
Com efeito, em razão de a decisão de improcedência acarretar coisa julgada material, tendo em vista a análise do mérito da questão, o provimento do recurso poderia estabelecer uma situação mais favorável ao réu, havendo, assim, interesse recursal.
Em sentido diametralmente oposto, logo, entendendo pela inexistência de interesse recursal do réu na hipótese, os professores Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart[2] sustentavam, dentre outras coisas, que o réu não teria direito ao julgamento do mérito, mas a uma resposta jurisdi-cional que considerasse sua defesa, no que se inclui a sentença terminativa.
Nos dizeres dos doutos professores:
Costuma-se questionar se o réu tem interesse recursal no caso de sentença terminativa, buscando sentença definitiva que venha a reconhecer a improcedência do pedido do autor. Contudo, o réu não tem interesse recursal algum quando a sentença lhe é favorável, embora não tenha julgado o mérito. É que o réu tem direito de apresentar defesa para que o direito afirmado pelo autor não seja reconhecido, o que pode ocorrer, como é evidente, não só no caso em que o mérito é apreciado e a conclusão é pela improcedência, mas também quando o processo é julgado extinto sem julgamento do mérito. Em termos mais claros, é preciso dizer que o réu não tem direito ao julgamento do mérito, mas a uma resposta jurisdicional que considere sua defesa. Esse direito é satisfeito no caso de sentença de extinção do processo sem julgamento do mérito, de modo que, quando isso ocorrer, não existirá interesse em recurso. Entender de forma contrária é o mesmo que concluir que o processo que termina em sentença de extinção do processo não atende ao direito do réu, ou ainda que o processo sempre deve culminar em sentença que aprecie o mérito. De qualquer forma, como a sentença de extinção do processo sem julgamento do mérito não produz coisa julgada material em relação à matéria não apreciada, será possível ao réu propor ação contra o autor para pedir o julgamento não realizado, desde que, obviamente, não seja reiterado o obstáculo (que já foi julgado) que impediu o julgamento do mérito do processo que foi anteriormente extinto.
Pois bem. Com a entrada em vigor do Novo Código de Processo Civil – Lei nº 13.105/2015 –, a controvérsia parece-me estar superada.
Isso porque referido regramento processual estabelece, de maneira expressa em seu artigo 4º, abaixo transcrito, e de forma indireta em outros de seus dispositivos, v.g. art. 6º, art. 139, inciso IX, art. 282, § 2º, art. 317, art. 319, § 2º, art. 321, art. 338, art. 352, art. 485, § 1º, art. 488, art. 933, art. 1029, parágrafo 3º, o princípio da primazia da decisão de mérito: “Art. 4o. As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa”.
Consoante depreende-se do dispositivo legal transcrito, a solução integral do mérito passou a ser um direito das partes, tendo sido construído todo o novo arcabouço de regras processuais com a finalidade de se empreender esforços e superar questões formais a fim de se obter a solução do mérito, consistindo, nisto, tal princípio da primazia da decisão de mérito.
Sendo assim, uma vez extinto o processo sem resolução do mérito, passou a possuir não apenas o autor, mas também o réu, interesse recursal visando à obtenção de uma sentença de mérito, tendo em vista tal provimento consistir, com a entrada em vigor do atual Código de Processo Civil, em direito das partes.
[1] O Novo Processo Civil Brasileiro.
[2] Manual do Processo de Conhecimento.