O caráter especial da carreira de assessor jurídico foi reconhecido, há 30 anos, na Constituição do Estado do Paraná, que entrou em vigor no dia 5 de outubro de 1989. No Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, o artigo 56 e seus parágrafos estabeleceram equiparação entre as funções ligadas à área do direito nos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. O conteúdo é o seguinte:

Art. 56. O assessoramento jurídico nos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário e a representação judicial das autarquias e fundações públicas serão prestados pelos atuais ocupantes de cargos e empregos públicos de advogados, assessores e assistentes jurídicos estáveis que, nos respectivos Poderes, integrarão carreiras especiais.

§ 1º. O assessoramento jurídico, nos órgãos do Poder Executivo, será coordenado pela Procuradoria Geral do Estado, visando atuação uniforme.

§ 2º. As carreiras de que trata este artigo serão criadas e organizadas em classes, por iniciativa dos chefes dos respectivos Poderes, no prazo de noventa dias da promulgação desta Constituição.

§ 3º. Aos integrantes dessas carreiras aplica-se, no que couber, o disposto no artigo 125, §§ 2º e 3º desta Constituição.

Adin ajuizada – Esses dispositivos, assim como vários outros do texto que havia sido aprovado, foram contestados pelo governo da época. No dia 11 de janeiro de 1990, uma ação direta de inconstitucionalidade (Adin) chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF), em petição assinada por Álvaro Dias, governador do Paraná, Wagner Brússolo Pacheco, procurador geral do Estado, e pelo procurador Rogério Distéfano (protocolo nº 000342/1990). A Adin recebeu o nº 175-2/600.

Procurador judiciário – O artigo 56 e seus parágrafos do ADCT, especificamente, atingem a carreira de assessor jurídico do Tribunal de Justiça (na época, dos Tribunais de Justiça e Alçada). Na sua alegação de urgência, o Estado do Paraná solicitou o deferimento de liminar (para suspender a eficácia dos dispositivos) sob o argumento de que a Assembleia Legislativa já havia votado uma proposta da iniciativa do Tribunal de Justiça que previa a transformação dos cargos de assessor jurídico em procurador judiciário. A mudança tinha por objetivo regulamentar a nova regra constitucional, e integrava o Projeto de Lei nº 379/1989.

Carreiras especiais – A liminar solicitada pelo Estado do Paraná foi deferida no dia 15 de janeiro de 1990 pelo ministro Sydney Sanches, encarregado, naquele período de recesso, da definição de matérias urgentes. Com isso, os artigos contestados foram suspensos, ad referendum do plenário. A votação colegiada, ainda na fase de liminar, aconteceu no dia 9 de fevereiro de 1990, já com o voto do relator sorteado, ministro Octavio Gallotti, que sustentou a aparente legitimidade do artigo 56 e seus parágrafos. Esse entendimento foi acolhido pela maioria do plenário, que revogou a liminar na parte que atingia as carreiras especiais – entre elas, a de assessor jurídico do Poder Judiciário.

Ação improcedente – No julgamento definitivo, concluído em 3 de junho de 1993, a constitucionalidade do artigo 56 e seus parágrafos do ADCT foi confirmada. Diz a ata do plenário: “Prosseguindo-se no julgamento, o Tribunal [STF], por maioria de votos, julgou improcedente a ação, para declarar a constitucionalidade do artigo 56 e seus §§ 1º, 2º e 3º do ADCT da Constituição do Estado do Paraná, vencido, em parte, o ministro Marco Aurélio, que declarava a inconstitucionalidade, apenas, do § 3º”.

Maioria dos votos – Os votos que formaram a maioria do plenário – incluído o do relator, ministro Octavio Gallotti – contêm argumentos que afirmam a natureza especial das funções exercidas por assessores jurídicos (veja trechos das manifestações na sequência). Na sessão que encerrou a análise da Adin nº 175-2/600, a Presidência do STF já estava sendo ocupada pelo ministro Octavio Gallotti, que assumiu esse cargo em 13 de maio de 1993. Os demais integrantes da Corte eram os ministros Sydney Sanches, Moreira Alves, Néri da Silveira, Paulo Brossard, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello, Carlos Velloso, Marco Aurélio, Ilmar Galvão e Francisco Rezek.

Decisão importante – Essa decisão, transcorridos mais de 29 anos do ajuizamento da Adin, continua a ser fundamental para a reorganização da carreira de assessor jurídico do Poder Judiciário do Paraná. Uma cópia integral do processo foi obtida pela Assejur, e está arquivada na sede da entidade de classe.

 

 


O que disseram os ministros do STF na Adin nº 175-2/600

 

Recebemos memoriais que demonstram, por exemplo, que os assessores jurídicos do Poder Judiciário são funcionários não só estáveis, mas concursados. Na verdade, em relação aos do Legislativo e do Executivo, exercem funções paralelas àquelas que exercem os procuradores do Estado, pelo menos no âmbito de consultoria. […] Em várias Cartas estaduais, temos visto que […] se vem tornando uniforme nos Estados a criação de procuradorias das Assembleias [Legislativas]. No caso, criam-se ainda procuradorias judiciárias, a título de prestação de assessoria jurídica ao Tribunal. Por isso, não há nenhum escândalo em que tenham o mesmo tratamento dos procuradores do Estado […] – dos consultores do Poder Executivo.

  • Sepúlveda Pertence
     

Vê-se, desde logo, que, no pertinente ao assessoramento jurídico do Poder Legislativo e do Poder Judiciário, não há margem alguma para a alegação, ínsita na petição inicial, de invasão da competência natural da Procuradoria Geral do Estado. É certo que não possuindo – as Assembleias [Legislativas] e os Tribunais – personalidade jurídica própria, sua representação em juízo é normalmente exercida pelos procuradores do Estado. Mas têm excepcionalmente, aqueles órgãos, quando esteja em causa a autonomia do Poder, reconhecida capacidade processual, suscetível de ser desempenhada por meio de procuradorias especiais (se tanto for julgado conveniente por seus dirigentes), às quais também podem ser cometidos encargos de assessoramento jurídico das atividades técnicas e administrativas dos Poderes em questão (Assembleias e Tribunais). Note-se que o artigo 69 do ADCT de 1988 até ensejou, nos Estados, manter consultorias jurídicas separadas de suas procuradorias gerais; sendo, pois, um minus em relação a esse permissivo a preservação de carreiras jurídicas especiais […].

  • Octavio Gallotti
     

Ataca-se, por fim, a equiparação de vencimentos resultante do § 3º do artigo 56, entre os integrantes das carreiras ditas especiais e os procuradores do Estado. […] Quando se trate […] de cargos com atribuições análogas ou interligadas (a ponto de a própria inicial sustentar devessem estar obrigatoriamente aglutinadas numa só carreira), não vejo como se objetar à igualdade de remuneração entre os seus ocupantes situados nas classes equivalentes.

  • Octavio Gallotti
     

De observar é […] que as atribuições dos assessores jurídicos do Poder Judiciário, no Paraná, correspondem, também, ao núcleo básico das carreiras jurídicas, quanto aos serviços de consultoria, assessoramento jurídico e inclusive representação […]. Exame das atribuições dos cargos jurídicos providos por […] servidores estáveis está a indicar, desde logo, que a solução pretendida pelo artigo 56 e seus parágrafos do ADCT da Carta paranaense não configura inconstitucionalidade em determinando que se criem, por lei, carreiras especiais no serviço jurídico. […] A Constituição Federal, no artigo 69 do ADCT, estipulou ser permitido aos Estados manter consultorias jurídicas separadas de suas procuradorias gerais ou advocacias gerais, desde que, na data da promulgação da Constituição, tenham órgãos distintos para as respectivas funções, tal como se verifica, quanto a essas atividades de assessoramento jurídico, no Paraná. […] De outra parte, pelo conteúdo ocupacional dessas carreiras jurídicas, no plano de cada Poder do Estado, verifica-se existirem situações de cargos assemelhados a justificar a aplicação, como estipula do artigo 56, § 3º, do ADCT em exame, dos princípios da isonomia e das vedações próprias das carreiras jurídicas a que se refere o artigo 135 da Constituição Federal […].

  • Néri da Silveira